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Um Mar de Pensamentos

... nasce do desejo inconstante de partilhar um pouco de mim e do que sou numa espécie de diário. Resumo-me em: Maria, 32 anos, signo gémeos, amante de livros, sonhadora, romântica, dramática q.b., viciada em chocolates.

Um Mar de Pensamentos

... nasce do desejo inconstante de partilhar um pouco de mim e do que sou numa espécie de diário. Resumo-me em: Maria, 32 anos, signo gémeos, amante de livros, sonhadora, romântica, dramática q.b., viciada em chocolates.

Pretty hurts.

Nem todas as músicas nos tocam da mesma forma. Umas nos tocam mais do que outras, outras embora gostemos não nos dizem nada. Tudo depende do momento em que as ouvimos, do nosso estado de alma, da forma como nos toca. E, nem sempre precisamos de entender a língua para entendermos o refrão. 

Nunca fui muito boa com o inglês mas depressa entendi o quão me dizia esta música...

A beleza dói. A beleza cansa. A beleza irrita. A perfeição é uma constante imperfeição.

Quantos de nós já não se deixaram ir abaixo com um comentário, mesmo que sem intenção, sobre o nosso aspecto físico? Quantos de nós, em algum momento, não se consideraram donos de uma má beleza? Quantos de nós, ainda hoje, não procuram a perfeição do corpo?

A beleza é sinónimo de dor. Somos educados para um estereótipo de beleza e de perfeição que machuca no corpo e na alma,

 

Mama said, you're a pretty girl

What's in your head it doesn't matter

Brush your hair, fix your teeth

What you wear is all that matters

(...)

Vogue says

Thinner is better

 

Dirão que não agradamos a gregos e a troianos. Dirão que aquilo que é feio para mim, para outro será belo. Dirão que nunca se atingirá a perfeição. Mas, pergunto, quem nunca chorou ou pensou que não seria suficientemente bonito ao olhar de outrem? Pergunto, quantos de nós nunca invejaram a perfeição que julgamos ver no corpo de outro alguém? 

 

Ain't got no doctor or therapeutic that can take the pain away

The pain's inside

And nobody frees you from your body

It's the soul that needs surgery

It's my soul that needs surgery

 

A perfeição não existe, bem o sei, mas todos, de uma maneira ou de outra, procuramos alcançar uma beleza perfeita. Fica a pergunta,

 

When you'r alone all by yourself

And you're lying in your bed

Reflection stares right into you

Are you happy with yourself?

A primeira etapa.

Vamos lá por partes: o facto de eu ter excesso de peso não significa que seja por excesso e abuso de doces. Nem todas as pessoas com problema de peso precisam de manter um grande problema com os doces, mas sim, com a comida em geral. 

Não sou daquelas meninas que se empanturra (embora já o tenha sido) de bolachas, pipocas, bolos, gelados e tudo o que haja de mais doce... ou que coma leite condensado e nutella às colheres. Também não sou daquelas que se excede nas comidas fast-food. A última vez que comi a chamada comida de plástico faz um ano.

Aliás, confesso, sou esquisita na comida. Tudo o que seja diferente do habitual é olhado de lado e com desconfiança. Caso a apresentação não me agrade, esqueçam, não me convencem. Sim, porque os olhos também comem. 

O meu ponto fraco é, inevitavelmente, o chocolate. Posso passar meses sem comer, mas sou menina para comer uma tablete todos os dias (basta sentir-me deprimida com o facto de estar sozinha - amizades - ou não conseguir um trabalho). É isso e ser, sem sombra de dúvidas, uma preguiçosa. Sou muito, mas muito preguiçosa.

Gosto de andar de bicicleta ou de fazer caminhadas mas, o primeiro que faça algo de modo a sair de casa... huy... sim, sou assim. Portanto, o meu problema é abusar no consumo de chocolate e dar-me para a preguiça.

Não é fácil aceitar que temos um problema e esse é precisamente o primeiro passo a dar para mudarmos a forma como nos vemos.

Já referi que, durante anos fui a patinha feia e gordinha da turma, sempre colocada em segundo lugar, a última a ser escolhida nos jogos em equipa. Para além de ser a gordinha, usava óculos fundo de garrafa, aparelho e um grave problema de acne (hoje, com 25 anos, ainda se mantém, embora em muito menor grau). Não só não aceitava que tinha um problema de peso, como também não aceitava os restantes problemas e, assim sendo, sem acreditar em mim, a comida tornou-se no primeiro refúgio. Ainda tentei forçar o vomito (porque na altura uma suposta amiga convenceu-me dos seus benefícios) depois de me descarregar na comida toda a minha raiva mas depressa percebi que não era a solução: ficava com a cara machada de vermelho e, ao fim de uma semana, a minha mãe deu conta de que todas aquelas marcas não eram somente de acne, oferecendo-me uma carga de porrada se descobrisse que andava a vomitar de forma propositada. Os meus excessos fizeram com que a balança aponta-se para três dígitos com apenas 18 anos. 

A entrada na universidade foi (provavelmente) o incentivo que me faltava, embora não da melhor forma: longe dos pais, fazia as refeições que queria e longas caminhadas para conhecer a cidade. Num ano perdi tanto peso que o meu pai julgou que ficaria doente. 

Porém, à medida que conheci a cidade, deixei-me de caminhadas e tornei-me preguiçosa... em vez de ir a pé, ia de autocarro. Nessa altura ainda meti na cabeça que ia para um ginásio. O facto de estar a pagar por algo era o meu foco de motivação (ainda não o referi, mas sou algo forreta com gastos supérfluos). Desisti da ideia quando descobri que o mais barato era frequentado por todo o tipo de pessoas, alguns para manter longe (segundo referencias da T., que conhecia a cidade). Actualmente, o único ginásio que existe na "santa terra" é extremamente caro e frequentado por altos elementos da "santa terra", portanto, prefiro manter-me nas caminhadas.

Felizmente, a "santa terra" é risca em paisagens atraentes e em diversidade e é isso que me vai motivando. Preciso sempre de algo que me motive. Todas as manhãs (bah, quase todas) lá vou eu, de fones nos ouvidos, a caminho do mar. Falta-me uma bicicleta e seria ainda mais feliz. 

Para a maioria das mulheres da minha idade, a motivação é entrar num biquíni no verão. No meu caso é vestir certas roupas sem parecer um saco de batatas com pernas. 

O primeiro passo é assumir que temos um problema e saber como contornar. Ninguém disse que seria fácil. Tenho dias em que o nego os meus problemas, outros em que só me apetece desistir e aceitar aquilo que sempre tive e, outros, ainda, em que não me vejo com problemas de peso. Eu acredito que ninguém escolhe ter excesso de peso, muito menos ser obeso (excepto esta), que são uma série de factores que nos deixam sem noção da nossa própria condição... mas, cabe a cada um de nós fazer o que estiver ao nosso alcance para o mudar. 

Estou na primeira etapa, é tempo de passar à segunda. Não posso viver eternamente como uma vítima das circunstâncias que vivi.

Agora fui... para a minha caminhada até ao mar.

Tenho excesso de peso.

 

 

Não é desde sempre, desde que nasci, mas desde os meus 10 anos, mais ano menos ano. Em tempos, o meu peso deixa-me frustrada. Era sinónimo de ser feia e de que nunca conseguiria ninguém. Nos tempos de escola, o drama do excesso de peso foi pior, com insultos diários ao qual se juntava o facto de usar óculos e sofrer com o imenso acne. Foram tempos difíceis em que julguei que a única saída fosse a morte.

A chegada ao ensino secundário melhorou um pouco mais a situação. O facto de não ser a única na turma com excesso de pesa traduzia-se em conforto. A (suposta) aceitação dos outros com as diferenças era reconfortante mas não me elevou a auto-estima perdida. A verdade, o acne, os óculos e o cabelo comprido não ajudavam a sentir-me confiante e bonita. Nesta altura tive a minha primeira paixão à qual a minha fraca auto-estima e confiança transformou num amor não correspondido.

A mudança aconteceria com a chegada à universidade. Era uma das caloiras e, posteriormente, das doutoras mais feias e forte mas, o tempo, traduziu-se em mudanças. Aprendi a gostar mais de mim e a usar troques que elevassem a minha auto-estima: perdi algum peso, cortei o cabelo, comecei a usar lentes, pintei o cabelo, comecei a usar maquilhagem, fiz tratamento para o acne, aprendi a vestir-me tirando partido do meu corpo. Embora ainda mantivesse o excesso de peso, a minha confiança aumentou um pouco mais. Consegui ter as minha primeiras aventuras amorosas, no entanto, só aos 20 é que consegui saber e sentir o que era um beijo. Aos 22, tive o meu primeiro e, até agora, com 25, único namorado. Embora ele gostasse do meu corpo, achava que poderia sentir-me ainda melhor e mais atraente se perdesse um pouco de peso. Nunca fez pressão para que seguisse o seu conselho, mas mencionava-o.

Hoje, com quase 26 anos, não me sinto mal com o meu corpo. Procuro formas de me sentir atraente e bem comigo mesma, não descuido a minha apresentação e procuro sair de casa sempre a sentir-me confiante com o que visto. Não considero que seja o meu excesso de peso a impedir-me de ter um novo relacionamento mas sim os traumas que a única relação me deixou aliado ao facto de não ter praticamente amigos.

Porém, às vezes vou abaixo e desejo ser como aquelas que aparecem com altos corpões... por isso, comecei a fazer algumas caminhadas/corridas, evitando alguns tipos de alimentos e comida e, em breve, comprarei uma bicicleta. Não consigo fazer uma dieta ou ser pressionada para tal. É claro que tenho uma meta e quero lá chegar, mas quero-o fazer ao meu ritmo, sem pressões. Não me sinto mal com o meu corpo, esta é a verdade. Pode parecer contraditório, mas só percebo que tenho excesso de peso quando não encontro o meu tamanho ou quando ele não me serve... aí, deixo-me ir abaixo. Mas, no meu dia-a-dia, sinto-me bem comigo própria. A maioria das pessoas nem me dá o peso real ou até me dizem que sou uma 'gordinha jeitosa'. Não quero nem gosto de seguir os estereótipos da sociedade, em ser magra é que é bonito. Não... para mim tal não é suficiente. O que eu quero é, acima de tudo, sentir-me ainda melhor comigo mesma... mais e mais, independentemente do que diga a sociedade que é bonito.