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Um Mar de Pensamentos

... nasce do desejo inconstante de partilhar um pouco de mim e do que sou numa espécie de diário. Resumo-me em: Maria, 32 anos, signo gémeos, amante de livros, sonhadora, romântica, dramática q.b., viciada em chocolates.

Um Mar de Pensamentos

... nasce do desejo inconstante de partilhar um pouco de mim e do que sou numa espécie de diário. Resumo-me em: Maria, 32 anos, signo gémeos, amante de livros, sonhadora, romântica, dramática q.b., viciada em chocolates.

13 | Na minha estante... A Bastarda de Istambul.

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 A Bastarda de Istambul é uma viagem à descoberta da história de dois países intimamente interligados entre si. Mais do que um romance, Elif Shafak convida-nos a mergulhar na memória de quem sobreviveu ao genocídio arménio comentido pelo Império Otomano, entre 1915 e 1917. Com sabedoria, usando e abusando, Shafak recorre à ironia e sarcasmo para relembrar os crimes do passado. A Bastarda de Istambul é, a meu ver, uma espécie de critica a turcos e arménios. De um lado, um povo que finge nunca ter cometido os crimes e, aqueles que admitem a sua existência, parecem descartar-se dos mesmo porque aconteceram sob domínio de um Império e não da actual Turquia; do outro lado, arménios que, de geração em geração, alimentam sentimentos sob o massacre arménio passando aos mais novos e cem anos depois, as memórias das atrocidades de quem sobreviveu. É, igualmente, uma critica a um país divido entre a modernidade e a tradição, entre o Ocidente e o Oriente, bem como ao papel das mulheres naquele país.

 

Elif Shafark dá-nos a conhecer duas jovens oriundas de famílias distintas, cujos sentimentos se assemelham e de vidas intimamente interligadas. Aysa, uma jovem determinada e irreverente, nasceu e sempre viveu em Istambul, numa casa rodeada de mulheres. Na família Kazanci os homens, em virtude de uma misteriosa maldição, vivem até perto dos quarenta anos de idade. Portanto, Aysa cresceu numa família de mulheres com personalidades distintas, encerrando em si, segredos e mistérios. Armanoush, é a prima arménia-americana de Aysa, a enteada de um tio que nunca conheceu, Mustafa, uma jovem introvertida e apaixonada por livros que, um dia, decidi conhecer a outrora cidade da família. A chegada da prima, levará Aysa numa viagem ao passado secreto da família e à história que interliga arménios e turcos.

 

A Bastarda de Istambul, nomeado para o Orange Prize For Fiction, é o primeiro romance traduzido e publicado, em Portugal, de Elif Shafak. Nascida em 1971, em França, é das escritoras mais lidas na Turquia e aclamada pela critica como uma das escritoras mais originais. Formada em Ciências Políticas, a leccionar em universidades dos EUA, Reino Unido e Turquia, Shafak dá voz, nos seus livros, às mulheres, minorias e subculturas. Uma última nota sobre este livro e a sua escritora: em 2006, foi levada a tribunal por "denegrir a identidade turca" em virtude de algumas palavras utilizadas pelas personagens arménias, mas as acusações acabaram por ser retiradas.

 

O meu interesse e curiosidade por A Bastarda de Istambul nasceu graças às diversas notícias a que tive acesso, além de envolver conteúdo da história internacional e visão actual das sociedades mencionadas - sobretudo da turca. Em si, a sinopse não me despertou especial atenção mas, de facto, o marketing é uma arma poderosa... e, neste caso, ainda bem. De facto, Shafak escreve de forma original, irónica e sarcásticas, prende-nos a cada palavra, a cada frase e, rapidamente, conseguimos nutrir sentimentos de empatia pelas personagens; embora, exija especial leitura, pela temática e por saltar entre o presente e o passado. A capa é, para mim, uma das mais bonitas que vi em livros e, quanto ao título, considero que se enquadra perfeitamente na história... até porque, o final é surpreendente.

 

Por tudo isto, espero, sinceramente, que outros livros de Elif Shafak sejam traduzidos para português. Recomendo, por conseguinte, a leitura deste livro.

Armanoush tinha a sensação de que sob as constantes objecções da tiazinha Varsenig às suas leituras se encontrava uma preocupação mais estrutural, se não primordial: um instinto de sobrevivência. Simplesmente não queriam que ela brilhasse demasiado, que se destacasse do rebanho. Escritores, poetas, artistas e intelectuais foram os primeiros dentro do millet arménio a serem exterminados pelo antigo governo otomano. Tinham-se livrado primeiro dos "cérebros" e só depois começado a extraditar os restantes - os leigos. Como muitas famílias arménias na diáspora, ali a são e salvo mas nunca totalmente à vontade, os Tchakhmakchian sentiam-se simultaneamente eufóricos e humilhados quando uma das suas crianças lia demasiado, pensava demasiado, desviava-se demasiado da normalidade.

 

* (mais sobre o livro em Editorial Presença

** (outras frases em Dos Meus Livros)

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